quinta-feira, outubro 25, 2007

Corporativismo Vs Desenvolvimento


Qualquer cidadão, cumprindo os requisitos na Lei pode, a partir de agora, ser proprietário de uma farmácia sem que o facto de não ser farmacêutico seja um critério de exclusão.

A pergunta que se impõe é: a propriedade da farmácia é importante ou significativa para os seus utentes? A resposta é não, o importante é que a Direcção Técnica esteja a cargo de um farmacêutico e isso continua igual.

O PSD teria tomado esta medida senão tivesse saído prematuramente do Governo.

Os corporativismos têm dado cabo do País. Estes criaram, por exemplo, as listas de espera nos hospitais, atrasaram o desenvolvimento na área da saúde e noutros sectores da sociedade mas essa é outra discussão.

É importante que as pessoas percebam que os farmacêuticos não passam a ser preteridos na propriedade das farmácias, ou seja, os não farmacêuticos não têm prioridade como referia ontem o DN na sua manchete, aliás vergonhosa porque veicula uma informação falsa que induz os leitores em erro. Propositado ou não, não sei. É mais um exemplo do corporativismo que falava.

Para mim a grande medida ainda está para vir. O Ministério da Saúde estuda a hipótese de dispensar nas farmácias de rua medicamentos que até aqui estavam reservados à exclusiva dispensa nas farmácias dos hospitais, por exemplo, medicamentos para doentes com HIV. Esta medida, a ser tomada, configura uma grande melhoria da acessibilidade para os utentes e o consequente aumento da qualidade de vida por não terem de passar largas horas a caminho do Hospital.

Tudo tem um “mas” e como estamos em Portugal tenho de fazer uma ressalva. Não sei qual será o método ou processo mas antes que me depare com um disparate deixo o alerta. As farmácias de rua que pretendessem aderir à dispensa destes medicamentos deveriam ter um programa informático que permitisse ao médico do Hospital enviar para o computador da farmácia a prescrição do utente. Esta dispensa também só poderá ser feita a doentes que cumpram os seus seguimentos em consulta, apenas por uma questão de controlo analítico indispensável a quem toma determinados medicamentos. Se assim fosse seria tudo mais simples mas espero não ter uma decepção.

A Organização Mundial de Saúde considera que o nível de desenvolvimento de um País se avalia pela forma como trata os seus doentes, idosos, deficientes, enfim, todos os que têm necessidades especiais. Perante isto reflictam sobre o verdadeiro desenvolvimento do País, sem nunca esquecer que cuidar não compete só ao Estado e aos Profissionais de Saúde mas a cada um de nós individualmente.

Como cuidamos os velhos e doentes da nossa família? Comecemos por aí…


Ana Rita Cavaco

16 comentários:

Paulo Colaço disse...

Mais uma psico-convidada, leitora e comentadora habitual do Psicolaranja, analisando aqui um tema a nosso pedido.

A Ana Rita Cavaco tem, nesta matéria, o peso da experiência de muitos anos de Enfermagem, apoiada no forte papel que desempenhou na equipa da Secretaria de Estado da Saúde no Governo Barroso.

Quanto ao assunto, nunca gostei de monopólios. Também não gosto que outros façam brilharetes à conta de ideias que o PSD tinha na forja e não concretizou.

Saúdo o fim deste monopólio de classe e aguardo outras melhorias na saúde.

Tété disse...

Concordo em pleno com a Ana Rita, porque as farmácias não são mais do que um grande negócio. Como negócio que são também devem poder ter um dono que não seja obrigatoriamente farmacêutico. Até porque o dono não está sempre presente na farmácia, nem o director técnico está!

A indústria farmacêutica é um grande lobby, é um mundo de interesses e muito dinheiro.

Também estou em acordo com a Ana no que toca a medicamentos específicos só serem fornecidos a doentes por ambulatório e não por farmácias comunitárias. As pessoas estão em todo o lado, logo o fácil acesso não é só para quem quer comprar uma aspirina! Os retrovirais e outros medicamentos devem estar disponíveis em todas as farmácias.

Não posso passar por aqui sem deixar um grande beijo à PsicoConvidada e agradecimento à Amiga que a Ana Rita é!

Marta Rocha disse...

Em relação às alterações relativas às farmácias julgo que já não há muito a dizer, este post foi além de esclarecedor muito completo.

Quanto à parte final, quanto à forma como tratamos dos nossos doentes e dos nossos idosos, este assunto é-me caro.

Quando foi diagnosticado à minha avó um cancro no fígado, com metástases por todo o lado, o meu pai trouxe-a para casa. A minha mãe é enfermeira e cuidou dela e o meu pai, como médico, nunca deixou que entrásse em sofrimento. Teve um fim de vida doente, mas com mais condições que as proporcionadas a qualquer outra pessoa.

Tinha 15 anos e via-a definhar diariamente com um sorriso nos lábios. Teve toda a atenção da família e "tombou" feliz.
Porque sei que não é isto que acontece na generalidade dos casos, julgo que é importante que os cuidados paliativos sejam consagrados como um direito fundamental na nossa constituição.

Filipe de Arede Nunes disse...

Concordo em absoluto com a autora do post! Acabemos de vez com este Estado coorporativo me nos mantem presos ao passado há tanto tempo.
Cumprimentos,
Filipe de Arede Nunes

Tété disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Tété disse...

Os cuidados paliativos são cuidados prestados a doentes em situação de intenso sofrimento decorrente de doença incurável em fase avançada e rapidamente progressiva. Desta forma devemos promover, tanto quanto possível e até ao fim, o bem-estar e a qualidade de vida destes doentes.

Contudo estes cuidados envolvem outras componentes como: o alívio dos sintomas, o apoio psicológico, espiritual e emocional do doente, o apoio à família e o apoio durante o luto, o que implica o envolvimento de uma equipa interdisciplinar de estruturas diferenciadas.

No nosso país devemos incentivar e promover os cuidados paliativos. Pelo que conheço do assunto existem apenas 7 unidades de saúde que os prestam e estão essencialmente na área litoral de Portugal. Das 7 só uma unidade é no interior do pais. O Serviço de Medicina Paliativa do Hospital do Fundão merece um grande respeito, não por ser do meu distrito, mas por prestar cuidados fundamentais numa área populacional envelhecida.

Para verem a miséria que Portugal é neste tipo de cuidados, deixo-vos a lista das restantes instituições que conheço (salvaguardo a hipótese de existirem mais, mas estas são as reconhecidas pelo Ministério da Saúde).

-Instituto Português do Cancro do Porto;
-Serviço de Medicina Interna e Cuidados Paliativos do IPO de Coimbra;
-Equipa de Cuidados Continuados do Centro de Saúde de Odivelas;
-Santa Casa da Misericórdia da Amadora;
-Santa Casa da Misericórdia de Azeitão;
-Equipa de Suporte em Cuidados Paliativos do Hospital de São João do Porto.

Anónimo disse...

Parabéns à convidada pelo post e aos psicóticos por lhe terem pedido este tema. Mostra que se preocupam com questões de extrema (e urgente) importância no nosso país.
Concordo quando dizem que temos que acabar com monopolio das farmácias. Temos mesmo!
Lendo o contributo da Marta e de como a sua família tratou da avó é de louvar, admirar e seguir... é um exemplo. O pior é que nem todas as familias têm condições profissionais, financeiras, sociais e principalmente humanas para tratar assim dos seus idosos. Algumas familias porque não querem mesmo outras por falta de todas estas condições. Neste aspecto considero que o Estado tem um papel importante em criar condições para que as familias tenham mais tempo p os seus idosos...bem, dava "pano p mangas" talvez noutro post ;-)

xana disse...

Parabens Ana Rita pelo post.

De facto é uma matéria bastante delicada, mas a medida é de absoluta importância. O corporativismo instalou-se logo a seguir ao 25 de Abril, e é impressionante como os seus tentáculos ainda se verificam nos dias que correm.`É preciso acabar com isso, ainda que aos poucos, é de louvar esta medida num meio como o farmacêutico que tanto poder mostra ter.

Quanto ao acesso a medicamentos fora dos hospitais, parece-me absolutamente fundamental. Por exemplo, relativamente ao HIV, não seria uma boa forma de começar a afastar o obscurantismo de tantos e encarar essa maleita sem preconceitos? Resta saber se os próprios portadores de HIV quererão sair assim do anonimato.

Os cuidados paliativos (ou a falta deles) daria para outro post, mas de facto, como a Ana diz no final do post, a actual situação no nosso país a esse nível demonstra bem como tratamos os nossos doentes.

Tânia Martins disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Tânia Martins disse...

O tema não me é muito familiar mas o post está extremamente bem explicativo.

Como cuidar dos nossos doentes, penso que embora o nosso sistema de saúde não seja o melhor, só nos resta mesmo deixar isso a cabo dos nossos profissionais de Saúde (que felizmente ainda existem).

EP disse...

Mais uma vez PARABÉNS Ana Rita pela pertinência e clareza do post.

Quanto ao assunto principal, o monopólio das farmácias, não me parece que haja muito mais a dizer. Como qualquer outro monopólio do genero, não faz sentido nem tem razão de ser. O que impressiona é que ainda subsista!

No que respeita a facilitar acesso dos medicamentos especificos em famácias comunitárias, a questão não me é familiar. No entanto, parece-me bastante sensata a posição da autora.

Ao ler o post pela 1º vez chamou-me a atenção a questão secundária (só,mesmo, neste post!) de como a nossa sociedade olha e trata os seus idosos, doentes, de um modo geral, todos os que necessitam de cuidados especiais. O papel dos cuidados paliativos e a humanização dos cuidados de saúde. Na altura pensei: Só isto dava um post.
Foi com agrado que percebi, quando passei para comentar que não fui a única :)

Fernanda Marques Lopes disse...

Não sou profissional da área da Saúde, mas ainda assim, como cidadã, parece-me bem tudo o que aqui foi dito, bem como o excelente post que comento agora também.

Quanto ao monopólio farmacêutico, não há muito mais a acrescentar ao que aqui foi dito. Já deveria ter acabado, a meu ver nunca se justificou a sua existência e como diz o Paulo, é pena que outros façam brilharetes à conta de ideias que o PSD concebeu.

Porém, ressalta-me à vista uma coisa muito importante dita pela Marta: a importância de consagrar legal e constitucionalmente os cuidados paliativos, enquanto direito fundamental. Há que promover a dignidade do ser humano, tanto na Vida como na morte.

FML

Anónimo disse...

Dou-vos os parabéns pelo tema escolhido e pela abertura a pessoas que não são membros do blog.

Gosto particularmente do texto e concordo com a posição do governo. Tenho no entanto dúvidas sobre a boa vontade do govreno para ir além desta medida.

Acho também que Sócrates tem o caminho facilitado porque os governos do PSD deixaram muita "papa" feita. Não tiveram foi tempo e às vezes coragem para assumir posições.

Anónimo disse...

Dou-vos os parabéns pelo tema escolhido e pela abertura a pessoas que não são membros do blog.

Gosto particularmente do texto e concordo com a posição do governo. Tenho no entanto dúvidas sobre a boa vontade do govreno para ir além desta medida.

Acho também que Sócrates tem o caminho facilitado porque os governos do PSD deixaram muita "papa" feita. Não tiveram foi tempo e às vezes coragem para assumir posições.

Margarida Balseiro Lopes disse...

Antes de mais, um agradecimento à Ana Rita por este precioso contributo que vem enriquecer a reflexão e o debate no Psico.
Quanto ao tema em análise, concordo plenamente que se combatam os carcomidos corporativismos que teimam em subsistir no nosso país com medidas destas.
É certo que, tal como a Ana refere, esta seria uma medida tomada pelo PSD se não tivesse caído o governo de Santana. No entanto, como tantas outras, foi o PS a protagonizá-la, facto que talvez mereça da nossa parte, enquanto social-democratas, uma reflexão. E passo a explicar: pela primeira vez, temos um governo socialista que tem levado a cabo reformas profundas em diversas áreas, que tem executado projectos, muito diferentemente, dos governos como o de Guterres. Esta era a imagem de marca do PSD. Esta alteração aos requisitos de propriedade de farmácia, o aumento da escolaridade mínima obrigatória, a reforma na administração pública, são algumas das medidas social-democratas levadas a cabo por este governo socialista. E porquê? A saída prematura do governo será a única justificação? Não terá havido também alguma falta de coragem dos nossos governos? A coligação com o CDS não poderá ter obstaculizado a linha social-democrata?

José Pedro Salgado disse...

Não sou, por princípio, contra o corporativismo.

Isto porque acho que é uma solução razoável perante impossibilidade ou inconveniência de o Estado regular determinado sector que necessite, ainda assim, de ser regulado.

O problema é que acabamos por ter sempre perversões do sistema que levam à criação destes poderosos monstros em sectores fundamentais da vida.

E concordo plenamente com duas coisas:

- A saúde é uma área que precisa de uma reforma de cima a baixo.

- O respeito pelos nossos cidadãos mais idosos é uma grande marca de evolução. E não pode começar pelo Estado.