Muita tinta tem escorrido sobre o que se passa no Tibete, apontando essencialmente o dedo ao desrespeito pelos direitos humanos. De facto, existem diversos relatos de prisões, tortura, pessoas corridas das suas propriedades, restrições ao quotidiano insuportáveis, restrições à liberdade de reflexão dentro dos mosteiros, etc.
Mas e se não for só isso?
Consideremos alguns factos. Aquilo que começou como um protesto de algumas centenas de monges a 13 de Março, rapidamente se converteu em manifestações massivas de comerciantes e agricultores.
Os veículos incendiados foram essencialmente Toyota Land Cruisers, Hondas e Audis, veículos emblemáticos da etnia Han (chinesa). As lojas incendiadas eram também essencialmente de empresas detidas por chineses.
Há seis anos Lhassa era uma cidade tipicamente tibetana, cuja influência chinesa, não obstante forte, era sobretudo sazonal (Lhassa fica a 3600 metros de altitude, e os Himalaias são de si já um bocado ventosos...). Transacto este tempo, a sua população duplicou, de 250 mil para 500 mil (sobretudo chineses, e que passam lá todo o ano), muitos dos seus bairros típicos foram substituídos por edifícios modernos de trabalho ou habitação (incluindo um centro comercial de 10 milhões de dólares, que também foi incendiado).
Hoje em dia todos os sectores da economia são dominados por chineses. Um exemplo são os táxis, cuja maioria tem ao volante chineses. Há que acrescentar que recentemente foi terminado o troço de caminhos de ferro entre a província chinesa de Qinghai e o Tibete, derrubando as últimas fronteiras de isolamento que o resguardavam da imigração chinesa.
Será que os tibetanos se começam a sentir inquilinos em sua própria casa?
12 comentários:
Se te fosses lixar oh Zé Pedro! :P
Estava eu a escrever um posto sobre isto... Só por causa disso nem li o teu e vou já aqui comentar com o meu texto:
Depois de ontem, na Via Sacra, o Papa Bento XVI ter lembrado a crise do Tibete, numa reflexão sobre as perseguições a católicos em alguns países cujo responsável foi Zen Ze-Kiun, arcebispo de Hong Kong, que escreveu as reflexões deste ano para este marco do calendário católico, hoje, foi o Presidente do Parlamento Europeu, Hans Gert Pottering quem defendeu claramente um boicote aos Jogos Olímpicos de Pequim caso a China continue a recusar o diálogo com o Dalai Lama, líder espiritual tibetano.
Confesso que me faz alguma confusão a reverência de alguns governos ocidentais (português incluído!) para com Pequim. Compreendo os interesses económicos. Compreender, até compreendo mas não deixa de me fazer ainda mais confusão! É o próprio Pottering quem diz que “A China é um parceiro importante da Europa” mas “o diálogo e a cooperação devem assim ser recíprocos”.
Recorde-se que o Tibete foi anexado como província chinesa em 1950, altura em que a China invadiu o território. Desde então tem havido denúncias de violação dos direitos humanos, resultantes de uma tentativa de genocídio cultural, por parte das autoridades chinesas. Mais recentemente, por ocasião do aniversário da revolta tibetana em 14 de Março, deu-se início a mais um período de violência contra manifestações pacíficas, com diferentes versões de parte a parte no que diz respeito ao número de mortos e feridos provocados pela repressão chinesa.
Toma!
Bruno:
Eu abordei este assunto de uma perspectiva pouco percorrida precisamente por achar que existe muito a dizer.
Assim, ainda bem que puseste aqui o teu post que abarca ainda outra vertente do problema.
É que este é daqueles berbicachos à moda antiga: não só há diversos problemas, como há diversas pessoas metidas ao barulho e cada qual com a sua própria versão do melhor caminho a tomar.
Assim, apelo aos futuros comentadores para, além de contribuirem com a sua opinião, ajudarem aqui a construir o emaranhado de questões que se formam à volta desta situação.
Olá a todo, e antes de mais, Santa Páscoa :)
Atendendo ao pedido do José Pedro queria então lançar aqui mais uma questão que julgo ser relevante. Vou falar da questão "Geracional"..
Quero dizer com isto:
Como o Bruno relembra, em 1950 o território do Tibete foi anexado pela China. Desde então o Dalai Lama praticou no exílio uma resistência baseada no pacífismo que lhe é característico.
Essa forma de resistência pacifica perdurou no Tibete durante 58 anos e coincidiu com uma geração que tem na sua memória os ensinamentos e a imagem do Dalai Lama.
Na minha opinião, a nova geração (que nunca viu o Dalai Lama no Tibete), não é tão favorável a uma resistência puramente pacífica e querem ser mais activos na sua luta contra a China...
É uma opinião que gostava de ver comentada. Penso que a perda (pelo menos parcial) da referência Dalai Lama na nova geração de jovens do Tibete levou ao esgotar da sua paciência, estando fartos de esperar (tempo demais)por uma solução baseada no pacifismo...
Por outro lado... As noticias que vêm da China valem isso mesmo.. Ao certo não sabemos coisas com muito pormenor. Mas só o facto de vedarem caminho aos jornalistas é caso para ter grandes suspeitas do que se esta a passar no Tibete...
Estou curioso para saber como esta história vai acabar. A China, melhor que ninguém, sabia dos riscos da organização do Jogos Olímpicos (JO)... Uma autentica faca de dois gumes. Por um lado, a demonstração de que é de facto uma super-potência, por outro o facto de ter de abrir as suas fronteiras como nunca o fez em toda a sua história moderna...
E atenção.. a China não deixou nada ao acaso para estes JO, na minha opinião, situações como estas já estavam previstas pela administração em Pequim mesmo antes dos incidentes terem lugar...
Vejamos como tudo se vai desenrolar, e esperemos que tudo se desenrole pelo melhor...
Abraços democráticos
O Tibete não é uma área em que me sinta à vontade para falar; sinto particularmente que tenho o juízo toldado pelo que a imprensa quer que eu pense, tal é evidência do sentido único que há na informação.
O que não quer dizer que não tenha opinião. ;) Fico particularmente interessado pela apresentação do Salgado no que toca à perda de referências da juventude tibetana: o que mantinha os tibetanos unidos era a crença no Dalai Lama. A China tem vindo a inculcar valores mais "urbanos" naquela comunidade.
Terão sido eficazes ao ponto de os jovens do Tibete lutarem pela sua própria independência menos do que pelo valor simbólico do Tibete (como a causa aparece sempre representada)?
Quanto ao Pottering... o menino não sabe estar calado? Não vale tudo para termos exposição mediática. No que toca a relações diplomáticas eu prefiro que ela seja feita pelos Estados ou, a haver uma tomada de posição da UE, que venha de Solana, de Durão ou do Pottering após uma votação no PE em determinado sentido.
P.S. Tenho de confirmar até se o PE se pode manifestar sobre estes assuntos. Mas, independentemente disso, este tipo de resoluções são aprovadas às dezenas devido à sua carga simbólica pura e inócua.
Gostava de saber, em específico, a opinião acerca da posição dos EUA sobre este assunto.
Já que os "propagandistas" da política externa dos EUA, que a justificam sempre com as grandes opções do Departamento de Estado ou whatever, utilizam-na sempre como bode escapatório para tudo :)
hihihihihihihhih
Interessantes as declarações desse grande homem de Estado, esse grande Presidente mr Bush, n'est pas?
O tema do Zé Pedro seria também a perspectiva que eu abordaria se postasse sobre este tema.
Lembram-se dos conflitos no Kosovo devido à enchente de albaneses no seu território?
A China tem inundado o Tibete de habitantes deslocados. Para quê? No dia em que houver um referendo, a maioria chinesa vota ao lado de Pequim.
Sim, Zé, os tibetanos começam a sentir-se inquilinos, depois de se terem, logo no início, sentido prisioneiros.
Quanto ao boicote nos JO, num Conselho Nacional da JSD, nos idos de 2000, eu, a Zita e o Bruno Vitorino, apresentámos uma moção para que Portugal não se apresentasse nos JO de Pequim.
A moção trouxe muita discussão no CSN mas não passou.
Perguntávamos: faz sentido levar um ideal de liberdade a um país destituído da mesma.
Respodeu a maioria: fará sentido matar os sonhos de milhares de atletas que treinam 4 anos para uma competição?
Mas para onde é que o Tibete pode andar?
O Tibete ante-China era um país, à falta de melhor expressão, medieval. Depois da invasão chinesa deu um gigantesco passo na sua evolução, criando esse fenómeno muito curioso de desagregação das raizes dos seus habitantes.
Este fenómeno nada tem de estranho, visto que é o mesmo princípio que assiste ao êxodo rural. Apenas tem algo de curioso num sentido: aqui não foi Maomé que veio à montanha, foi a montanha que veio a Maomé. De outra maneira, não foram os tibetanos que foram para a cidade, foi a cidade que foi para os tibetanos.
Assim, heis que temos um povo marginalizado no seu próprio país, com uma cultura que lhes foi imposta, mas sem possibilidades reais de voltar ao país que tinham. Nem desejos, diria eu.
No que toca aos jornalistas, felizmente o único jornalista estrangeiro a inda creditado para estar no Tibete é relativamente credível, visto pertencer à The Economist. Ainda assim, creio que os essenciais da questão passam.
Aliás, passam melhor para nós do que passam para os chineses, por exemplo.
Quanto ao Pottering, ainda não percebi com que autoridade é que ele falou. Não sou defensor de que ele possa falar distintamente na qualidade do cargo que exerce e como pessoa anónima, mas ele estava a falar em que qualidade?
Já a política norte-americana continua no seu mesmo estilo:"The right hand doesn't know what the left hand is doing."
Enquanto Pelosi reuniu com o Dalai Lama, Bush afirmou que a magnitude da quetão tibetana não justificaria um boicote às olimpíadas.
Desculpa Jorge, mas tu estás a criticar uma opinião que ainda não sabes qual é?
Ou ainda pensas que quem faz a Política Externa dos EUA são os humores de um Presidente?
Não sei qual delas é a pior suposição... mas nenhuma me surpreende ;)
Quer Bush quer o Departamento de Estado entendem que o Tibete não é razão para se boicotar os JO. Condi pediu moderação à China.
E assim fala o Líder do Mundo Livre! Nada de novo, apenas diplomacia eheh
Nem eu te surpreendo nem tu a mim meu caro ;)
Nem a hipocrisia política dos EUA. Afinal, chatear o seu maior credor? :P
Cuidado com a história JFD. Mesmo antes da China ser o maior credor dos EUA já a política norte-americana era de não-hostilização directa, usando mesmo a sua relação para contra-balançar o domínio soviético.
Bem, peço-te então que me elucides por forma a não cometer erros!
jfd, USA, USA, USA, USA, USA, USA!
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